Em entrevista à RH Magazine, Fernando Neves de Almeida, managing partner da Boyden Portugal, defende que "depois de uma retoma económica assente na procura externa e na criação de emprego, importa agora fazer da produtividade um fator de crescimento, competitividade e bem-estar social."

By Flávia Brito

Um inquérito a líderes de negócios nos EUA, publicado em novembro do ano passado e no qual a Boyden participou, revelava que a esmagadora maioria dos setores e indústrias não esperava uma recessão nos seis meses seguintes. Mas a médio e longo prazo eram vários os fatores a criar incerteza em relação ao futuro da economia.

Falámos com Fernando Neves de Almeida, managing partner da Boyden Portugal, para perceber qual o cenário em Portugal: “salvaguardando as devidas diferenças entre as economias norte-americana e europeia, e por acrescento a portuguesa, podemos dizer há alguns sinais de um abrandamento generalizado da economia – mas um abrandamento é diferente de uma recessão. Para já, o mercado de trabalho está forte. Por isso, a coisa mais importante é não deixar os receios originarem uma recessão.” Para o executivo, os líderes deverão preparar-se e ter uma estratégia, equilíbrio e talento que seja resiliente de forma a conduzir as organizações em tempos de maior incerteza: “no caso da economia portuguesa a produtividade deveria ser o foco”.

A baixa produtividade em Portugal é já uma preocupação há vários anos. O que acha que está a impedir o país de avançar para um cenário mais positivo?

A produtividade nunca foi encarada, discutida e tratada como um dos principais problemas da economia portuguesa. Nos últimos quatro anos houve perdas de produtividade num contexto de crescimento económico e, por este caminho, o PIB potencial não aumentará.

A acumulação de capital e o aumento do fator trabalho entre 2014 e 2018 não foram acompanhados de um modo geral pelo progresso tecnológico, apesar de mais capital fixo na economia (essencialmente privado porque o público quase não cresceu) e de mais pessoas a trabalhar. Da combinação não resultou uma melhor forma de trabalhar nem um melhor perfil de crescimento da economia portuguesa.

Depois de uma retoma económica assente na procura externa e na criação de emprego, importa agora fazer da produtividade um fator de crescimento, competitividade e bem-estar social.

Comparando com os países da União Europeia, a produtividade do trabalho em Portugal, definida em termos de PIB por trabalhador, representava 76,6% da média comunitária. Olhando para a compensação por hora trabalhada, ou seja, salários e contribuições sociais, a média em Portugal é de 11,5 euros, enquanto em Espanha é de 19,7 euros, Alemanha 32,6 euros e na zona euro é de 23,7 euros. Portanto, em Portugal, é um valor muito baixo.

Uma das explicações pode ser que durante uma recessão serem “destruídos” trabalhos menos produtivos, mas a produtividade por horas trabalhadas depende de muitos fatores e não apenas da capacidade de produzir, mas da estrutura da economia.

Portugal tem de facto um défice estrutural de produtividade, sendo a sua resolução um dos grandes desafios atuais.

Não devemos esquecer que a produtividade determina em boa medida a qualidade de vida dos cidadãos, pois aquilo que país consome está ligado ao que produz.

De que forma a economia e as empresas podem ser afetadas se este cenário da baixa produtividade não se alterar?

Tal como sucede nos EUA e em outros países da União Europeia, em Portugal há uma grande massa de empresas com produtividade muito reduzida. Por essa razão, a utilização de médias é particularmente enganadora relativamente aos reais desenvolvimentos individuais das empresas que compõem uma economia.

A unidade relevante para discutir a evolução da produtividade é a empresa, uma vez que é a sua capacidade individual para utilizar os recursos disponíveis e criar valor que determina a competitividade agregada.

Para uma empresa, a produtividade é decisiva na criação de valor para o mercado sem aumentar o capital investido, os custos do fator trabalho ou outros inputs. Por isso, o sucesso de uma empresa depende muito do desempenho laboral, na medida em que este pode permitir a redução das despesas de produção, a melhoria da qualidade de bens e serviços, o aumento das margens de lucro, o incremento da eficiência interna e a subida dos salários. Só que a produtividade resulta de vários fatores (capital humano, capacidade tecnológica, intensidade de inovação, segurança no trabalho, organização interna, liderança…), alguns deles de grande complexidade.

Assim se explica que nos setores de elevado valor acrescentado e alto conteúdo tecnológico a produtividade seja significativamente maior do que nas atividades menos qualificadas. Logo, um país onde predominam os serviços de proximidade e as microempresas, como Portugal, dificilmente não terá um problema de produtividade e, consequentemente, uma tendência para desequilíbrios nas balanças. Com a agravante de que Portugal é um dos países da OCDE com níveis de escolaridade mais baixos entre os jovens adultos.

Assim, numa altura em que o crescimento do emprego parece ter estacionado e sem que se vislumbrem ganhos expressivos de produtividade o crescimento do PIB encontra-se fortemente condicionado.

A resolução do problema da produtividade passa, por um lado, pela qualificação do capital humano e, por outro, por uma subida na cadeia de valor. As empresas devem reforçar o investimento em formação profissional.

Como podem as organizações contribuir para aumentar a produtividade nos seus setores?

Quando a produtividade sobe a competitividade de uma economia acompanha. Sendo a produtividade uma medida que, no longo prazo, funciona muito bem para medir o bem-estar do país e o seu o nível de competitividade, os ganhos de produtividade são fundamentais na medida em que permitem gerar recursos que podem ser canalizados para o investimento pelas empresas e, ao mesmo tempo, sustentar aumentos nos salários reais.

A evolução da produtividade resulta da contribuição de vários fatores para além da quantidade e qualidade do capital humano, designadamente de incrementos no stock de capital disponível por trabalhador e do progresso tecnológico.

Paralelamente, é preciso mais conhecimento, inovação e tecnologia para capacitar o tecido empresarial e dar-lhe assim condições para aumentar a produtividade laboral.

Fala em aumentar os salários como uma medida necessária para aumentar a produtividade. Considera então o aumento do salário mínimo como uma medida positiva?

Sim, mas não de forma isolada. Para mudar a produtividade é preciso aumentar salários, gerir melhor os recursos humanos na administração pública, flexibilizar a legislação laboral e, eventualmente, implementar sistemas de flexisegurança para não piorar a qualidade de vida das pessoas. Mexendo nestas várias coisas em simultâneo, não tenho dúvidas que a produtividade aumentaria e as organizações estariam muito mais capacitadas.

A escassez de talento tem também consequências para a produtividade e crescimento empresariais, obrigando a trabalhar no planeamento de forma a conseguir o desenvolvimento de um negócio e a persecução de novas oportunidades.

De que forma, o executive search pode impactar positivamente a vida das organizações e a produtividade?

Os recursos humanos adequados são sinónimo de desenvolvimento das organizações, sejam privadas ou públicas, pequenas, médias e grandes, todas elas a necessitar do melhor talento. O que faz a diferença nas organizações são as pessoas. Uma pessoa bem escolhida pode fazer toda a diferença e está mais que comprovado que o executive search é o melhor método de fazer a correspondência entre as necessidades de pessoas para a organização e o melhor talento disponível no mercado.

A forma como a economia global evoluir continuará a ter um grande impacto nas tendências de procura, aquisição e retenção de talento executivo e as organizações mais ágeis do ponto de vista da utilização e implementação de executive search terão mais hipóteses de garantir as melhores pessoas.

Existem medidas ao nível da gestão de pessoas que podem também contribuir para o aumento da produtividade em Portugal?

Sim. A liderança é uma das formas que poderá ajudar a melhorar a produtividade.

Os líderes e gestores devem focar-se nas questões estruturais da economia e serem proativos em vez de reativos. E no caso de Portugal a produtividade deveria ser o foco. Com este pano de fundo, os líderes empresariais deverão preparar-se e ter uma estratégia, equilíbrio e talento que seja resiliente para a conduzir as organizações em tempos de maior incerteza e volatilidade.

No próximo ano e meio a dois anos deverá haver uma diminuição dos ganhos em todos os setores ao mesmo tempo as organizações continuarão a tentar atrair o melhor talento para assegurar que têm o calibre certo de liderança e competências para lidar com uma economia mais turbulenta e ajudar a aumentar a produtividade.

Os líderes conhecem o negócio, a indústria e a cultura. São os ativos mais valiosos de uma organização e com o input certo conseguem assegurar um aumento da produtividade, que o negócio prospera, e por consequência, que a economia melhora e o país progride.

 

Flávia Brito
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